terça-feira, 22 de setembro de 2009

Equipe = Cooperação = Sintonia

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“Era uma casa bonitinha, apenas o terreno em frente maltratado, abandonado, oferecia um aspecto desolador.
Manhã de feriado e o marido, sem ter o que fazer, estava ali olhando e pensando...
A mulher estava passando o dia na casa da mãe.

Ele resolveu buscar a enxada.
Cortou fundo... Revirou a terra... Quebrou os torrões.
Trouxe adubo, tornou a remexer para misturar bem.
No dia seguinte, quando voltasse do trabalho, traria sementes de hortaliças e sua horta seria uma beleza...

A esposa só voltou à noite e nada percebeu.
Bem cedinho, lá se foi ele para o trabalho.
Ela levantou-se e ao ver o terreno preparado teve uma idéia: plantaria lindas flores...
Correu ao mercadinho, comprou as sementes e as plantou.
O marido, quando chegou, plantou também as suas.
Ela estava muito ocupada com seus afazeres domésticos e nada percebeu.

Sem saberem dos planos um do outro ficaram esperando e observando...
Quando as folhinhas, de um verde-pálido, sobrepujaram os torrões de terra – as sementes haviam germinado – o marido constatou que não fora aquilo que ele plantara e, por isso, arrancou tudo.
Quando chegou a vez das hortaliças, com igual raciocínio, a esposa fez o mesmo.Continuaram esperando... E nada."
(Autor Desconhecido)

Em uma equipe onde não se trabalha
em sintonia uns com os outros,
o fenômeno é parecido...

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O Poema

E pra não ficar dúvidas sobre a questão do "POEMA" ali no título do blog, vamos fazer uma incursão pela Literatura.
Pra começar descobri que existem algumas divergências entre o que significa Poema e Poesia. Em geral são considerados sinônimos mas, segundo o vocabulário técnico da Literatura, Poesia é o gênero de composição poética e Poema é a obra deste gênero.
O escritor Assis Brasil explica que o Poema é o objeto poético, o texto onde a poesia, que é uma forma, se realiza (como o soneto que tem dois quartetos e dois tercetos, ou quatorze versos juntos, como é conhecido o soneto inglês).
Quando essas normas de composição são eliminadas, passando um texto a ser apresentado em forma de linhas corridas, como usualmente se conhece a prosa, então se pode falar em um "Poema em forma de prosa", desde que tal texto, numa identificação sumária e mecânica, apresente um mundo "poético", ou seja, mais expressivo, menos referente à realidade.
A distinção se torna por vezes complexa, mas o que importa é que a poesia pode estar presente tanto no poema que é realizado com uma determinada regra conforme os seus versos e rimas, quanto em um texto, que pela característica poética, adquire a qualidade do Poema em forma de prosa.

Referência:
Brasil, Assis. Vocabulário técnico de literatura. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1979.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

O Trabalho na Instituição Carcerária e a Terapia Ocupacional

(Adriana Nogueira)

Uma instituição carcerária é, segundo Goffman (2003), uma instituição total, “onde um grande número de indivíduos com situação semelhante, separados da sociedade mais ampla por considerável período de tempo, levam uma vida fechada e formalmente administrada”, e seu poder disciplinar reside na prática da manipulação do tempo e do espaço.


(www. portalnahora. com. br /administra /imagens2 /gra_1220970405. jpg)


Segundo a Lei de Execuções Penais brasileira (BRASIL, 1984), “o trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva” (art.28); “o condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade”, sendo que ”para o preso provisório, o trabalho não é obrigatório e só poderá ser executado no interior do estabelecimento (art.31 e seu parágrafo único); e “constituem dever do condenado a execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas” (art.39, inciso V).

Esta lei preconiza ainda que exista uma “proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação” (art.41 inciso V), sendo que este direito pode ser suspenso ou restringido, conforme o parágrafo único deste artigo, “mediante ato motivado do diretor do estabelecimento”, ou seja, a extensão da jornada de trabalho pode ser utilizada como recurso de punição.

Outra questão sobre práticas punitivas relacionadas à atividade laboral do preso encontra-se na Seção IV do Título V da referida lei, na qual encontramos que “o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi-aberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena” (art.126); que “a contagem do tempo para o fim deste artigo será feita à razão de 1 (um) dia de pena por 3 (três) de trabalho” (art.126, parágrafo primeiro); e que “o tempo remido será computado para a concessão de livramento condicional e indulto”. Entretanto, indica o artigo 127 que “o condenado que for punido por falta grave perderá o direito ao tempo remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar”, caracterizando assim que este processo de remissão da pena via trabalho prisional também se configura como um recurso disciplinador.

A Penitenciária Estadual “Professor Aluízio Ignácio de Oliveira”, localizada no município de Uberaba/MG, com uma área de 60 mil metros quadrados, possui 144 celas distribuídas para abrigar 396 pessoas condenadas a cumprir pena de reclusão, sendo que para manutenção da ordem e disciplina trabalham cerca de 200 agentes de segurança (MINAS GERAIS, 2006). Esta instituição encontra-se atualmente superlotada, abrigando 675 internos, conforme informação fornecida por seu diretor a um veículo de comunicação local (IDALÓ, 2009).

Dentre esse contingente populacional de indivíduos cumprindo suas penas nesta penitenciária, dezesseis (16) deles, que estão sob o regime de prisão semi-aberto, prestam serviços para o Horto da Prefeitura Municipal de Uberaba. Outros noventa e cinco (95) realizam atividades laborais dentro da própria instituição, sendo trinta (30) pessoas na prestação de serviços para a empresa “Bag Fértil” (costura de alças e fundos de sacos para armazenar fertilizantes); dez (10) na produção de móveis sob encomenda na oficina de marcenaria; quatro (4) na oficina de costura na qual se reforma os uniformes usados na instituição; vinte e cinco (25) em serviços gerais tais como limpeza do pátio, entrega de marmitas, lavagem de roupas e poda do jardim; e vinte e seis (26) na horta da instituição, cujos produtos são utilizados na alimentação dos internos e o excedente é doado a famílias de baixa renda que moram na área circunvizinha à instituição (MINAS GERAIS, 2009)

A Penitenciária conta ainda com um programa educacional regular (ensino fundamental e médio) para os condenados, com aulas dentro da própria instituição, sendo que em outubro de 2007 foi implantado um curso superior, cujas aulas se realizam dentro da própria unidade. Possuindo trinta meses de duração, o egresso deste curso receberá o título de Tecnólogo em Produção Sucroalcooleira (MINAS GERAIS, 2008)

Estas iniciativas do sistema penal em oferecer ao indivíduo preso formação educacional e profissional, são ações que, segundo a socióloga Fernanda Vasconcellos, não se constituem instrumentos efetivos para a reinserção social e reeducação do indivíduo condenado à reclusão nas unidades prisionais e se estabelecem mais como uma forma de afastar o ócio do cotidiano da unidade prisional. Além disso, também funcionam como um meio de categorização da população encarcerada em “presos trabalhadores” e “indivíduos criminosos”, pois se percebe que “os presos que não querem trabalhar logo são identificados com o mundo do crime pela instituição penal, assim como pelos próprios internos e, através dessa identificação, a população prisional acaba por ser dividida em dois grupos: o grupo de indivíduos que estão ligados ao crime e o grupo dos indivíduos que estão ligados ao trabalho. O trabalho prisional não foge à ética social do trabalho. Ele aparece nas representações coletivas como um valor universal que diferencia os homens de bem, sendo sinal de decência, organização e marca de honestidade” (HASSEN, 1999 apud VASCONCELLOS, 2007).

Outro aspecto das dificuldades enfrentadas pelo sistema prisional, que contribuem para a ineficácia dos programas educacionais e laborais, é a questão do impacto da cultura prisional no ser humano, que se caracteriza pela submissão do indivíduo preso às agressões físicas e/ou psicológicas sofridas no ambiente carcerário, configurando o processo denominado “institucionalização”, no qual o indivíduo se deixa moldar pelas tradições, valores, atitudes e costumes impostos pelo ambiente institucional. Esta “cultura penitenciária”, com hábitos peculiares de ação, linguagem, forma de alimentar-se, dentre outros, interfere de maneira profunda no processo de reintegração desta pessoa à sociedade extra-muros (BARRETO, 2006).

Portanto, configurando-se como um determinante desta reintegração social, um processo reeducativo eficaz deve auxiliar o ajustamento do indivíduo consigo mesmo e com seus papéis sociais, a sua interação sócio-econômica-cultural e a sua não reincidência na conduta anti-social. Esta reintegração social deve ser entendida como um processo desenvolvido pelo próprio indivíduo, através de uma reeducação automotivada e construída gradativamente ao longo do período do cumprimento de sua pena. Nesta reeducação, “a terapêutica social é tratada como seu eixo fundamental”, entendendo-se esta terapêutica como um meio de instrumentar esta pessoa para a realização das mudanças comportamentais necessárias, e não apenas habilitá-la educacional e/ou profissionalmente. (AGUIAR, 2004).

Desta forma, a Terapia Ocupacional, desenvolvendo seu trabalho de maneira intersetorial e insterdisciplinar, através de seu corpo de conhecimento, pode oferecer alternativas para de fato promover essa reintegração social do indivíduo que encontra-se neste processo. Promovendo o seu desenvolvimento pessoal, aprimorando a sua capacidade criativa, crítica e reflexiva, bem como as suas habilidades para o desenvolvimento profissional em uma sociedade que os reconheça como cidadãos e não como criminosos.


Referências:

AGUIAR, U. O sistema penitenciário e os Direitos Humanos – a ressocialização e as práticas organizacionais. Bahia Análise & Dados - Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Salvador, v. 14, n. 1, p. 209-222, jun. 2004.

BARRETO, M.L.S. Depois das grades: um reflexo da cultura prisional em indivíduos libertos. Psicologia Ciência e Profissão vol.26, nº4, p.582-593, dez.-2006.

BRASIL. Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei de Execuções Penais - Lei 7.210 de 11 de julho de 1984.
Disponível em: www. planalto. gov. br/ccivil/leis/L7210.htm

GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2003, p. 24.

IDALÓ, E. Penitenciária já abriga dobro da capacidade. JM Online, ago. 2009. Disponível em: www. jmonline. com. br/novo/?noticias,5,POL%CDCIA,13894

MINAS GERAIS. Agência Minas, Secretaria de Estado de Defesa Social, Subsecretaria de Administração Penitenciária. Governo inaugura penitenciárias de Uberaba e Patrocínio. Mar.2006. Disponível em: www. agenciaminas. mg. gov. br/detalhe_noticia.php?cod_noticia=7733

MINAS GERAIS. Agência Minas, Secretaria de Estado de Defesa Social. Parcerias contribuem para ressocialização de presos. Jan.2008. Disponível em: www. agenciaminas. mg. gov.br/detalhe_noticia.php?cod_noticia=17221

MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Defesa Social. Detentos de Uberaba produzem mudas para o Horto Municipal. Disponível em: www. seds. mg. gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=535&Itemid=71

VASCONCELLOS, F.B. Trabalho Prisional e Reinserção Social: Função Ideal e Realidade Prática. Revista Sociologia Jurídica. Nº 5, jul/dez.2007. Disponível em: http://sociologiajur. vilabol. uol. com.br/rev05fervasconcelos.htm

Princesa

(Heliana Castro Alves)*



Para a princesa solitária que habita meu universo feminino...
“Era uma vez uma princesa encantada que tinha nos cabelos verdes o brilho orvalhado de todas as florestas do mundo.
Era outra vez essa mesma princesa encantada.
Tinha os lábios azuis, como se guardasse os sete oceanos do planeta.
Ao acordar, pela manhã, saciava a sede do universo. Seus olhos eram vermelhos como fogo e sua tez de todas as cores imagináveis.
Ela era, porém, a mais solitária das criaturas.
Vagava pelo mundo, nua com seu corpo aéreo, e era invisível, tanto para os seres mais ínfimos, quanto para os seres mais colossais. Porque princesa não tinha tamanho.
Era, apenas Era.
Deserta-se sem reino, sem pátria, sem voz.
Seus movimentos, leves como pensamentos.
O ventre feito de terra cheirando chuva.
E asas voláteis de sonhos inacabados.
Caminhava pelas montanhas livre e silenciosamente.
Seu silêncio vigiava a noite e contava segredos para as estrelas piscantes. Mortalmente silenciosa. Olhar vago, amplo de oceanos profundos.
Algumas vezes, princesa adormecia deitando-se sobre as formas das montanhas que a abraçavam como extensas almofadas acolhedoras.
As velhas anciãs acobertavam seu corpo com o sussurro dos ventos uivantes que, entre as árvores, entoavam melodiosas canções de ninar. Engravidava de sonhos.
Outras vezes, porém, sua alma etérea a guiava para dentro do pólen da mais pequena flor, ou para o quebranto de uma fonte de águas termas.
Ela podia se moldar à uma pedra ou às asas de um pássaro, mas sua alma estava sempre livre e silenciosa, habitando um universo insondável, cercado de mistério, sombra e luz.
Era uma vez, e será sempre,um lugar,uma princesa,uma mulher,uma forma de luz que gere, pari, verte leite e morre todos os dias para depois renascer,
em cada pôr-do-sol,
no silêncio da noite,
procriando humanidades”.




* Heliana Castro Alves é Contadora de Histórias e Terapeuta Ocupacional, Mestre em Educação Especial pelo PPGEE da UFSCar e Professora da Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM pelo departamento de Terapia Ocupacional

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Atividades Humanas e Terapia Ocupacional


O uso das “atividades terapêuticas” é encontrado desde meados do século XIX e início do século XX. Orientadas por médicos, encontravam-se principalmente como sendo parte da rotina institucional asilar. Nos anos 1960 outra forma de compreensão das atividades veio acrescentar-se, forma esta que, sob influência médica e psicológica, buscava um aval científico no campo da Terapia Ocupacional. Observa-se então, nos EUA, uma crescente especialização da Terapia Ocupacional na área da reabilitação física. Nessa fase, a lógica do tratamento do paciente psiquiátrico também sofreu alterações, direcionando-se à reabilitação psicossocial dessas pessoas ( CASTRO, LIMA & BRUNELLO, 2001).

Essas autoras nos encaminham à reflexão de que, nesse contexto, no Brasil, a Terapia Ocupacional buscava formar profissionais que atuassem conforme a necessidade do indivíduo. Entretanto esses profissionais encontravam, nas instituições nas quais passavam a atuar, um conceito de “atividades” ainda arraigado nos preceitos do “Tratamento Moral” proposto por Pinel. A lógica das atividades sem significado e não direcionadas às necessidades da pessoa prevalecia à essa nova proposta de trabalho.

A partir de então diversos estudiosos, terapeutas ocupacionais e outros profissionais da área da saúde, observaram a necessidade de repensar as formas de emprego das atividades no setting terapêutico, procurando desconstruir a relação imediata vigente entre atividade e terapeuticidade.

Nos anos 1970/80 observa-se então uma busca de um novo modo de olhar a prática da Terapia Ocupacional, sob a influência de dois movimentos importantes: a luta pelos direitos dos deficientes físicos e pela desinstitucionalização dos pacientes psiquiátricos. Passa-se então a conceber as atividades humanas como constituídas por um conjunto de ações que apresentam qualidades, demandam capacidades, materialidades e estabelecem mecanismos internos para sua realização. Elas podem ser desdobradas em etapas, configurando um processo na experiência da vida real do sujeito.

A linguagem da ação é um dos modos de conhecer a si mesmo, de conhecer o outro, o mundo, o espaço e o tempo em que vivemos, a nossa cultura. As atividades dão forma e estrutura ao fazer das pessoas, estabelecendo um sistema de relações que envolvem a construção da qualidade da vida cotidiana. E a qualidade da vida cotidiana nada mais é que a percepção subjetiva do sujeito sobre seu bem estar e sua condições de vida.

O cotidiano não é a rotina, nem a mera repetição automatizada de movimentos ou ações que levem um fazer por fazer, segundo FRANCISCO (2004) é o espaço individual onde buscamos praticar nossas atividades de forma criativa e transformadora, é o "nosso" espaço, na vida!


Referências:

* CASTRO, Eliane Dias de; LIMA, Elizabeth M.F. de Araújo; BRUNELLO, Maria Inês Brito. Atividade Humanas e Terapia Ocupacional. In: DE CARLO, Marysia .M.R. do Prado; BARTALOTTI, Celina Camargo. Terapia Ocupacional no Brasil: Fundamentos e Perspectivas. São Paulo: Plexus, 2001. Cap.2.

* FRANCISCO, Berenice Rosa. Terapia Ocupacional. 3ª ed. Campinas: Papirus, 2004.

Arte, Artesanato e Terapia Ocupacional



Em seus textos “Arte e Artesanato na Produção de um Corpo Sonhador” e “Métodos de Terapia Ocupacional ou Jogos de Acontecimentos”, Marcus Vinícius Almeida nos convida a uma reflexão sobre os conceitos estabelecidos em nossa sociedade para a arte e o artesanato; e de como os métodos e modelos da Terapia Ocupacional podem, e devem, seguir um “paradigma estético”.

Ao apresentar-nos suas próprias reflexões sobre as definições de arte e artesanato observa que os mesmos não se constituem aptos a exercerem o seu papel conceitual.


A sociedade ocidental os estabeleceu de uma maneira hierarquizada, onde a arte sobrepuja o artesanato, e consequentemente, os sujeitos envolvidos em tais fazeres são divididos também quanto ao fazer a que se dedicam.


Nessa lógica exclusivista, a arte seria um fazer inédito, fruto da criatividade do “artista”, e o artesanato, uma mera execução de um projeto desenvolvido por outra pessoa. Exemplifica esse modo de pensar os movimentos de Arte Concreta (SP) e a Pop Art (EUA).

No campo da Terapia Ocupacional, o papel conceitual de arte e artesanato também encontram-se em uma forma confusa, sendo que de um modo geral, parece também dar mais valor à arte. Isto pode ser visto no termo cunhado no âmbito acadêmico onde encontramos a especialização em “Arteterapia”. Seria possível uma “Artesanatoterapia”?

Os conceitos, portanto, produzem entendimentos, porém estes, também são produzidos ao nível da afetividade e da perceptividade, e são tão vigorosos quanto aqueles. Assim o artesanato, em terapia ocupacional, deve ser entendido como uma forma de transformação dos corpos, sua caotização e conseqüente reestruturação.

Ainda em relação ao Artesanato, é digno de nota a questão da repetição, que se concebe como uma aprendizagem, o ato da transformação que demanda tempo.
O fazer artesanal é a produção de um novo corpo, através do contato com novas forças: um corpo-artesanal, sendo que a clínica em terapia ocupacional deve passar por esses dois momento para efetivar-se: o corpo-arte e o corpo-artesanal.
Faz necessário o entendimento dessa potência terapêutica que é o fazer a arte e o artesanato, que não se resume à um projeto “mental”, mas também a um projeto “arquitetônico”, uma “micropolítica do corpo, do sujeito”.

Sendo assim, nesse processo do fazer arte-artesanato, os conceitos são o que menos importa, pois o resultado é que é a essência do processo.
Os métodos, e principalmente os modelos, serviram para que a Terapia Ocupacional fosse pensada, e assim engrandecida a utilização de seu utensílio básico de trabalho: a atividade.
Um método, não é apenas uma forma de avaliação e condução de uma prática, ele desvenda caminhos escolhidos implicitamente.

Nesse caminho, vemos que a Terapia Ocupacional utiliza-se de metodologias de campos próximos como, por exemplo, a dança, a arte e os jogos. Porém, para conseguir a sua legitimação enquanto “verdade” é nos modelos e métodos científicos que busca a sua consagração.
Assim, foram sendo sufocados campos como a intuição, a sensibilidade, o lúdico, o estético, que se estabeleceram à margem, "problemas" para que a Terapia Ocupacional obtenha a sua legitimação.
Pela postura científica que lhe foi cobrada, enquanto ciência da área da saúde, a terapia ocupacional estabeleceu o seu “grande método”: a Análise da Atividade, que se estabeleceu como uma forma “positivista”, mas capaz de dar reconhecimento científico à profissão e ser a base de muitas teorias que sustentam esse reconhecimento.

Apesar de muitos desejarem novos conceitos para a Terapia Ocupacional, o autor lembra que muitos destes conceitos foram construídos ao longo do tempo e formam a memória da profissão.
Mas é possível a busca de um método de análise que ajude a pensar em conjunto com outros campos, outros saberes e outros métodos, sem deixar que a atividade perca o seu lugar de destaque.

Almeida nos convida à uma reflexão profunda sobre a verdadeira essência da Terapia Ocupacional enquanto saber “terapêutico”, visto que muitas de suas técnicas e métodos foram sendo construídas em uma base positivista, pela necessidade de reconhecimento da cientificidade da profissão, mas saberes necessitam serem resgatados pelos Terapeutas Ocupacionais, saberes que incluam, além das “verdades científicas” estabelecidas, uma nova forma de se analisar o fazer dos sujeitos, enquanto corpos mutantes que são construídos e desconstruídos ao desenvolver de cada atividade.


Referência:
ALMEIDA, Marcos Vinícius. Corpo e Arte em Terapia Ocupacional. Rio de Janeiro: Enelivros, 2004. Cap.7 e 10.

As Bases Filosóficas e Teóricas da Prática da Terapia Ocupacional

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As diversas profissões existentes evoluem com o passar dos anos e cada uma delas tem a sua história. Compreendendo as origens e a evolução da terapia ocupacional, podemos entender a sequência do desenvolvimento dos conceitos que foi acontecendo paralelamente à prática profissional.

A variedade do conhecimento que os primeiros terapeutas ocupacionais trouxeram representou tanto um alento quanto um problema. A herança de conceitos e habilidades da medicina, psicologia, enfermagem, artes e ciências humanas permitiu a eles uma visão holística do ser humano, mas ao mesmo tempo foram sendo construídas críticas à cientificidade da nova profissão.

É possível identificar, nesse emaranhado de descrições teóricas básicas, seis conceitos que se referem aos fundamentos teóricos da terapia ocupacional:

(a) “O grande projeto”, que descreve o que é a terapia ocupacional, sua filosofia, seus princípios, pressupostos, valores e crenças, e a natureza de sua prática;
(b) “Conhecimentos emprestados”, que proporcionam explicações úteis de função e disfunção da base cientifica e justificativa da prática (Ciência emprestada), e fornece ao terapeuta um repertório de habilidades úteis para o tratamento da disfunção ocupacional (Habilidades emprestadas);
(c) “A versão da Terapia Ocupacional”, que é uma síntese dos elementos do conhecimento emprestado com idéias que se desenvolvem dentro da profissão, na experiência prática da Terapia Ocupacional, fornecendo uma base bem definida para a prática e ajudando no raciocínio clínico;
(d) “Terapia Ocupacional pura”, que são modelos de prática desenvolvidos por terapeutas ocupacionais para simplificar, explicar e organizar os conhecimentos relevantes da terapia ocupacional com a sua prática;
(e) “Fazendo funcionar”, que é a aplicação de um modelo ou estrutura de referência que se identifica em relação ao paciente, proporcionando ao terapeuta um repertório de métodos, avaliações e técnicas apropriadas e compatíveis.

Tentando combinar o conhecimento biomédico e psicológico com conceitos retirados das ciências sociais e da arte foi sendo criada uma “inconsistência filosófica”, nas palavras de Rosemary Hagedorn, que começou a preocupar os profissionais. Sendo assim, educadores e teóricos da terapia ocupacional demonstraram a necessidade de escapar do “conhecimento emprestado” e identificar teorias e princípios dentro da prática profissional.

A partir de então as teorias vêm sendo descritas por vários autores que nem sempre se utilizam da mesma linguagem. Palavras como, por exemplo, "paradigma", "modelo", “estruturas de referência” e “abordagem” foram sendo usadas de forma aleatória e com diferentes significados para cada um dos autores.

Ainda não existe um consenso internacional para definir como alguns termos e conceitos devem ser descritos, e Hagedorn nos apresenta em seu texto uma comparação dos mesmos entre diferentes autores, e mencionando a sua “aversão pelo uso impreciso da linguagem no contexto acadêmico”, nos apresenta as suas escolhas:

“Paradigma” são os pressupostos, perspectivas e valores básicos da profissão. É uma visão geral daquilo que interessa aos profissionais, um plano global do que fazem dando coerência à profissão. Um “modelo” orienta o que deve ser feito, simplifica a compreensão das coisas tomando vários elementos diferentes e, mostrando a relação entre eles, os transforma em um todo unificado. Os “quadros de referência” são um sistema de teorias que servem para descrever a aplicação, na prática da terapia ocupacional, das teorias originadas em outras profissões. "Abordagens” são os meios e formas de se colocar a teoria em prática que, segundo Hagedorn, devem possuir conceitos coerentes em seu conjunto; obrigar o profissional a pensar e agir focado em seu trabalho; orientar uma ação apropriada à individualidade do cliente; fornecer ao terapeuta um conjunto correlacionado de avaliação e técnicas de tratamento para cada especificidade; e capacitar o profissional para o julgamento dos sucessos e deficiências na abordagem utilizada.

Segundo esta autora, existem relações e interações complexas entre estes conceitos: elementos de diversas teorias e práticas têm seu lugar no paradigma da terapia ocupacional; os quadros de referência são adaptados para a prática profissional e formam quadros de referência aplicados; o paradigma da terapia ocupacional e os processos de mudanças formam os modelos, que por sua vez usam abordagens que vem de quadros de referencia compatíveis, e ainda, o modelo da Terapia Ocupacional pode produzir a sua própria abordagem.

A apresentação desse percurso filosófico-histórico da prática da terapia ocupacional mostra que há um esforço intelectual por parte daqueles que se dispõem a lutar por um ideal de uma profissão, que culminou nos atuais modelos de práticas baseadas no cliente e em uma visão social e humanística dos conceitos de saúde, incapacidades e cuidado.

Referência:
HAGEDORN, Rosemary. Fundamentos da Prática em Terapia Ocupacional. São Paulo: Dynamis, 1999. Cap.4.